quarta-feira, 16 de setembro de 2009

deep black hair

Na noite passada os meus beijos eram do cabelo preto.
E toda minha vida passava por aqueles fios.
Meu corpo virava uma imensidão de caminhos, de buracos.
Meus ouvidos davam passagem pros sons (Fuzzy?) e meu nariz dava passagem praquele cheiro que meu deus, pudera eu explicar.
Minha pele virava espectadora da dela.
Meus órgãos, células e tudo mais paravam de trabalhar por alguns segundos pra poder sentir os dela trabalhando.
E meu nariz abria passagem pro vento que saía do nariz dela, da boca dela.
E eu sentia o cheiro do que ela respirava e expirava. Você sabe como é isso?
Existe algum tipo de magia em cheirar o tal cabelo preto. É uma coisa que me falta as palavras pra descrever mas é mais ou menos assim: você cheira e aquele cheiro entranha, é o tipo de coisa que você sabe que nunca mais sai dali. E que de repente pode surgir assim do nada em você, só pra lembrar que ainda tá ali.
É um cheiro superpoderoso. Um misto de pele com cabeça com shampoo com sei lá mais o que que acaba virando o cheiro dela.
E é daqueles cheiros (e a essa altura eu não sei por que uso ‘daqueles’ como se existisse outro) que você simplesmente só cheira e cheira até o cheiro sair, entende?
Mas na verdade ele não sai, ele só fica no teu nariz e tudo, tudo mesmo passa a ter aquele cheiro.
E se eu fosse um objeto qualquer ficaria lisonjeado.
Porque é o cheiro dela.

Eu queria ter um vocabulário rico pra poder descrever o resto pra você.
O corpo, entende?
O pescoço, a garganta branca igual a leite.
Os olhos pesados, levíssimos.
Dos pés à cabeça é tudo perfeito, é tudo defeito.
O cabelo dela como diz na música é molhado de lágrimas e adeus.
Mas quando eu volto o cabelo já secou e eu posso mergulhar naquele cheiro de novo.
Ela te joga na cara o quanto é pós-tudo, exala dormindo o tire suas mãos de mim e ao mesmo tempo é tão frágil, tão me aperta, tão minha que eu até acredito.
Ela tá ali, inteira pra mim.
A boca é um poço das tais palavras mordazes e de toda doçura do mundo.
Ela inteira é um poço de contradição.
Não tem aquela coisa de ame ou odeie, é faça os dois.
Mas me deixa falar da textura daquela pele.
Aparentemente não existe nenhum cuidado especial, o que torna a coisa mais louca ainda.
Nasceu assim, sabe como?
Textura dos anjos, dos céus e de tudo mais que existir.
As costas são um deserto, um monte de nada que é bom de tocar.
A luz da TV quando faz sombra no ombro é de fazer qualquer um chorar.
É quase meia-noite, passou o horário nobre então me deixa falar.
E não, a intenção não era rimar.
Você gosta de ser bicho?
Eu gosto de ser bicho com ela.
Eu que geralmente não gosto de ser bicho porque quando eu sou bicho por inteira eu gosto de apertar forte, sabe? Gosto de sentir meu outro bicho perto, gosto de proximidade.
Mas com ela não tem dessa, a gente grita que é bicho.

Agora eu vou falar só um pouco de mim, na verdade, só de uma parte de mim que é quando eu olho pra ela.
Imagina a cena: uma criança faz aniversário dia 27 de julho e ainda é 15 de maio e quando a data vai se aproximando ela vai ficando ansiosa pra saber se vai ganhar a tal bicicleta azul que espera desde quando passou de ano, e a data chega, sabe? E o pai entrega o presente e a criança paga com aquele olhar de gratidão e aquele olhar de quem tá olhando pra coisa mais preciosa da vida.
Eu sou a criança e ela, a data, a bicicleta.

E o sorriso?
Ah, o sorriso.
De tão bonito a gente sorri junto, é simples.

E sobre o cabelo preto, me deixa falar só mais uma coisa:
Cheio das palavras sussurradas, molhado com as lágrimas, marcado com os dedos, escondendo o rosto, o cheiro, a cor, a beleza, os segredos e tudo mais que a compõe: é meu.
O cabelo preto é o segredo dela.
Mas ele é castanho.



Today she took a train to the south.

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